STEINBRUCH CONDENA PATRULHA DA MÍDIA NA ECONOMIA
Presidente da CSN, Benjamin Steinbruch, se espanta com o fato de até as desonerações fiscais, que reduzem o Custo Brasil, serem questionadas por jornais conservadores; é, segundo ele, "a patrulha da ortodoxia contra a presidente da República"
9 DE ABRIL DE 2013 ÀS 07:11
247 - O empresário Benjamin Steinbruch, da CSN, é um dos raros representantes do setor industrial a colocar abertamente suas visões sobre política econômica. Articulista da Folha, ele se diz espantado com a patrulha da ortodoxia contra a presidente Dilma. Leia abaixo:
A patrulha da ortodoxia chega a tal ponto que até as desonerações têm sido contestadas
"Patrulhamentos" são corriqueiros no país. Infelizmente, porque denotam quase sempre preconceitos. Mas surgiu uma nova modalidade nessa atitude "fiscalizatória", a patrulha da ortodoxia contra a presidente da República.
O fato se deu há quase duas semanas, depois que Dilma Rousseff fez declarações em Durban, na África do Sul, que não agradaram ao mercado financeiro.
Em resumo, a presidente disse o seguinte: "Eu não concordo com políticas de combate à inflação que olhem a questão da redução do crescimento econômico, até porque nós temos uma contraprova dada pela realidade. Tivemos um baixo crescimento no ano passado e houve um aumento da inflação porque teve um choque de oferta devido à crise".
Em seguida, a presidente falou do choque inflacionário do ano passado, vindo da alta das commodities no exterior, do programa de formação profissional com vistas ao aumento da produtividade, das desonerações de folha de pagamento e da cesta básica, da redução do custo de energia etc.
Só então Dilma disse as frases que mais irritaram os patrulheiros: "Esse receituário que quer matar o doente em vez de curar a doença, ele é complicado, você entende? Eu vou acabar com o crescimento do país? Isso daí está datado, isso eu acho que é uma política superada. Agora, isso não significa que o governo não está atento e, não só atento, acompanha diuturnamente essa questão da inflação".
Tão logo a fala da presidente foi divulgada pelas agências de notícias e pela televisão, o mercado ficou nervoso. Os juros futuros caíram, numa imediata frustração das expectativas sobre um provável aumento da Selic neste mês.
O mercado logo concluiu que as declarações da presidente representavam um sinal claro de que ela é contra a elevação dos juros. E isso foi tachado pelos patrulheiros de interferência indevida da presidente na área da política monetária, atentando contra a autonomia e a credibilidade do Banco Central.
Embora o BC brasileiro não tenha independência, ele goza de autonomia outorgada para conduzir a política monetária. Isso, porém, não quer dizer que a presidente da República não possa dar a sua opinião a respeito da inflação, do crescimento econômico e até da política monetária. Por que não? Diariamente, dezenas de analistas, identificados ou não, opinam sobre essas questões. Por que não a presidente?
Em nenhum momento ela se referiu à questão conjuntural dos juros. Fez apenas uma defesa -e feliz- da adoção de políticas que cuidem ao mesmo tempo da inflação e do crescimento, algo nada diferente do que estão fazendo lá fora inúmeros países durante a atual crise, principalmente os EUA.
A patrulha da ortodoxia chega a tal ponto que até as desonerações têm sido contestadas, sob o argumento de que "são apenas um alívio temporário para os preços e não representam um instrumento de combate à inflação". Talvez estejam certos os patrulheiros, mas as desonerações precisam ser saudadas até por uma questão de coerência.
Quando se reduz o preço da energia, há um impacto anti-inflacionário apenas momentâneo, mas, além disso, há um efeito muito importante na redução do "custo Brasil" e no aumento da competitividade do produto brasileiro.
A desoneração das folhas de pagamento, por exemplo, era uma antiquíssima reivindicação não só dos empresários mas de toda a sociedade. Na legislação anterior, inflexível, quanto mais pessoas as empresas empregassem, mais taxadas elas eram. Essa injustiça está sendo corrigida e já há mais de 40 setores desonerados. Outros 14 passarão a receber o benefício a partir de 2014.
O que há por trás da patrulha ortodoxa é um imenso mau humor do mercado com a queda do rendimento financeiro no país. Com a redução da Selic para 7,25%, taxa ainda elevada em relação às de outros países, não se ganha mais dinheiro fácil como antes. É preciso arregaçar as mangas e produzir.
O que a presidente disse em Durban é de uma correção exemplar. Ela simplesmente observou que não aprova políticas que sacrifiquem o crescimento em nome da redução de uma inflação que não é produzida por excesso de demanda. Isso é o que qualquer político responsável diria.
DELFIM CONDENA LOBBY PELA ELEVAÇÃO DOS JUROS
Ex-ministro diz que a crítica à suposta "leniência" do Banco Central com a inflação é ideológica e publica um duro artigo contra os lobistas do sistema financeiro, como os economistas Ilan Goldfajn, do Itaú Unibanco, e Alexandre Schwartsman, ex-Santander
9 DE ABRIL DE 2013 ÀS 06:55
247 - Contra o lobby dos juros altos, dá-lhe Delfim Netto. Nesta terça, o ex-ministro publica um duro artigo, no Valor Econômico, condenado as manobras pela elevação da taxa Selic. Leia abaixo:
A atitude cautelosa do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central tem gerado ferozes críticas por parte do mercado financeiro. Elas vão desde: 1) a suposta leniência com o combate à inflação, que derivaria da crença ideológica (severamente rejeitada por toda a experiência histórica) de que "um pouco mais de inflação estimula um pouco mais de crescimento"; 2) passa pela crença de que o governo que estimulou, e se empenhou politicamente na baixa da taxa real de juros, não aceitaria o seu aumento, mesmo quando fosse a solução recomendável, devido à impopularidade que provocaria; e 3) termina numa dúvida moral sobre a autoridade monetária, que não teria autonomia para manobrar o seu único instrumento de ação horizontal: a taxa de juro real. Nenhuma delas faz sentido.
A crítica de que há leniência com a inflação por motivos ideológicos é, ela mesma, "ideológica". Apoia-se em velhas crenças, incorporadas aos programas do PT e do PDT, quando eles não haviam amadurecido. Na verdade, o que ela revela é a compreensão que a inflação brasileira tem causas mais complexas e a sua solução não pode ser reduzida à fórmula simples de aumentar a taxa de juro real.
O governo sabe que o namoro inflacionário duradouro com a banda superior da meta (5,8% nos oito anos de governo Lula e 6,2% nos dois anos do governo Dilma) é um convite à sua persistência. Isso deteriora as expectativas e reintroduz a incerteza na fixação dos salários. Com a dramática experiência inflacionária que temos escondida em nosso subconsciente, todos sabemos que isso acabará levando à indexação ainda maior da nossa economia. E sabemos, também, como isso termina...
A segunda crítica faz pouco da inteligência do governo. Quando as condições objetivas mudam, a política muda. Da mesma forma como foi correto reduzir a taxa de juro real absurda, à qual sobrevivemos durante as últimas décadas por equívocos da política monetária, será correto, se o Copom achar necessário, elevá-la com a mesma moderação que usam todos os países.
Antes de prosseguir permita-me recusar o terceiro argumento. Ele é ridículo. Faz uma imensa injustiça a um economista altamente qualificado, o ministro Tombini. Basta olhar para sua tranquila firmeza, para a sua formação acadêmica e a sua história como pesquisador, para entender que não é "pessoa para fazer o que mandam".
O que existe mesmo entre a autoridade monetária e os seus críticos, principalmente os economistas mais ligados ao sistema financeiro, é uma percepção diferente da realidade nacional e das incertezas que a cercam. Essa diferença cognitiva não significa uma diferença "científica", se é que se pode dar tal realeza às visões diferentes da relação relativamente tênue, mesmo no curto prazo (e inexistente no longo), entre a variação da taxa de inflação e a variação do nível de desemprego. A autoridade monetária estaria tecnicamente inferiorizada diante dos bem apetrechados profissionais que assessoram as finanças privadas.
Com relação à qualidade do conhecimento, experiência e sutilezas de funcionamento desse mercado fugidio, que é o financeiro, nem nossos mais sofisticados economistas daquele setor, ou da academia, podem competir com as informações armazenadas nas cabeças dos profissionais que habitam o Departamento de Estudos e Pesquisa (Depep) do Banco Central. Quem tiver alguma dúvida, deve comparar a "ciência" das assessorias financeiras privadas e da academia, com a "ciência" do Depep, revelada, por exemplo, no "Using a DSGE Model to Assess The Macroeconomics Effects of Reserve Requirements in Brazil" (Working Paper Series - 303, Jan., 2013), dos competentes economistas Waldyr Areosa e Christiano Coelho.
Ele explora as diferenças das respostas das variáveis macroeconômicas das manobras nas reservas bancárias e na taxa de juros utilizando um "Dynamic Stochastic General Equilibrium Model" (DSGE). E conclui que uma redução da relação de reserva tem o mesmo efeito qualitativo de uma redução da taxa de juros do Banco Central, ainda que seu efeito quantitativo seja menor, como era mesmo de esperar.
É preciso reconhecer que uma taxa de inflação anual de 5,9% nos últimos dez anos (30% sistematicamente acima da meta) já deveria ter mobilizado governo e sociedade para reduzi-la. A taxa de inflação é o radiador que dissipa o calor produzido pelos atritos no funcionamento dos mercados. E 4,5% é seguramente maior do que os 2,5% a 3,5% que parecem estabilizar as expectativas e fazê-los funcionar razoavelmente bem, na grande maioria dos países.
É mais do que óbvio, entretanto, que produzir esse resultado está fora do alcance da política monetária. Ele será consequência de uma política social e econômica, que tenha por objetivo continuar a manter a inclusão social com o suporte de medidas que reforcem as instituições e produzam mudanças estruturais, que estimulem a competição e reduzam os atritos.
Acreditamos que a visão do Banco Central tem tanta consistência quanto a do "mercado", o que recomenda sua cautela na manipulação da taxa de juros real. Até agora, a visão do primeiro tem se revelado a mais ajustada à nossa realidade e mais antenada com a situação da economia mundial. Se o que o Copom previu para o futuro próximo não se realizar - e a realidade mostrar a necessidade de uma manobra que sancione o aumento da taxa de juro real -Tombini a fará com a mesma tranquilidade e autonomia com que tem recomendado a "cautela". Quem viver, verá.